Campo de futebol

A manhã demorou tanto para Tate que ele se amaldiçoou várias vezes por não conseguir dormir. Impaciente e, não afim de acordar Mel, ele se levantou, afastando-se dela. O fato foi que mexera nela enquanto dormia. Mais especificadamente, na calça dela...
Para pegar o isqueiro. E, feito isso, ele se esgueirou pelos corredores do lugar, procurando algo de interessante a se fazer.
O fato foi que, quando amanheceu, não só o pacote de cocaína estava mais seco do que ela poderia lembrar que estava quando Tate o usou, como também o garoto loiro não estava ali...

Mel ainda precisou esperar alguns minutos depois de seus chamados, até que ela finalmente pode ouvir o som de uma porta batendo em algum lugar depois do corredor. Passos começaram a ecoar quando já próximos de onde ela estava, e logo Tate se revelou, o isqueiro dela numa mão e uma caixa de tamanho médio de papelão empoeirado na outra.

- Hey, bom dia.

Ele ergueu a mão que segurava o isqueiro, parando os passos que aproximavam-no dela apenas para fitar o objeto.

- Bem, eu estava sem sono no meio da noite, então usei isso pra acender uma tocha improvisada. Não fique brava, ok?- Tate jogou o isqueiro para ela, voltou a se aproximar e sentou-se ao seu lado, rindo baixinho do comentário dela. Os olhos dele estavam realmente vermelhos e irritados daquela vez, e ele fungou algumas vezes enquanto observava a caixa. Parou Lançou um olhar à perna dela, e em seguida fitou Mel, num olhar indagativo, como se perguntasse se estava tudo bem. Contudo, ele começou a falar:- Gostaria que tivesse, mas acho que não. Está maneira demais pra isso. Achei num dos cômodos daqui. Quer ver? Ainda não abri. Ouvi você chamar antes disso.

Ele riu baixinho do comentário dela. Já tinha percebido antes que o isqueiro era realmente um objeto importante para Melissa.
Tate voltou a fitar a caixa, e puxou a tampa de papelão. Uma barata saiu correndo pela manga da blusa dele, e depois caiu em seu jeans para logo depois correr de susto para longe.
Tate não se assustou, contudo, e logo pousou a caixa em seu colo para que Mel também pudesse ver melhor.
Havia algo como baterias, pilhas velhas, um giz de cera partido ao meio, dois pacotes entrecortados de plástico, pequenos e quadrados, de cores chamativas, o que claramente eram camisinhas velhas. Por debaixo daquilo tudo, quando Tate inclinou a caixa um pouco e as coisas escorregaram apenas para um lado, eles puderam ver uma revista.
Uma revista com dois homens semi-nus se abraçando de um jeito levemente erótico.
"Gay Playboy" em letras neon logo acima daquela imagem.

- Acho que quem quer que esteve aqui estava animado. - Tate comentou, sem alterar muito a expressão, embora quisesse rir daquilo.

- As pessoas podem ter fetiches estranhos.- Ele se livrou da revista pornô, ou melhor, deixou-a no colo de Mel.- Achei que toda garota gostasse de pornô gay.

Ele vasculhou ali dentro ser um aparelho celular sem chip e uma bíblia de bolso.
Tate franziu o cenho, folheando as páginas ali.

- Essa pessoa já deve estar fodida na AIDS mesmo. Ninguém de bem vem bater uma num lugar assim.

Se Tate pudesse se lembrar.
Se suas memórias não tivessem sido quebradas e rompidas.
Ele poderia ver o quanto era hipócrita dizendo aquelas palavras.

- Eu acho que pornô gay é quente.- ele disse, folheando ainda as páginas da bíblia -que ousadia, quem sabe - de um modo tão diferente que não se pode definir se era brincadeira ou não. De qualquer forma, ele olhou para ela um pouco surpreendido a seguir.- Você conhece o conto? Sério?

- Não estou falando que foi batendo uma que ele pegou.- Tate deu de ombros, jogando a bíblia num canto qualquer de poeira.- Sabe que é tudo um monte de merda, certo? Esses dizeres que tem nesses livrinhos. Só querem afastar você de quem você realmente é e do que realmente quer fazer. Tirar a autenticidade.

Ele a olhou de forma duvidosa, com um sorrisinho de canto como quem diz "eu sei o que você fez no verão passado".

- Não acredito em você quando fala que não gosta de pornô.

Tate coçou a cabeça, fungando outra vez.

- Um dos melhores contos que já vi. Seria ótimo se as trevas estivessem numa caixa. Mas as trevas está nas pessoas.

Ele se levantou, batendo as mãos no jeans para se livrar de parte da poeira... e em seguida estendeu uma das mãos para ela.

- Você já quer sair daqui?

Ele vasculhou dentro da caixa. Nada mais de interessante. Apenas uma folha que havia se desprendido da bíblia que ele segurava.
Pegou-a, pondo-se a dobrá-la aqui e ali, tornando-a pontuda, fazendo curvas. Até se tornar um aviãozinho de papel com escrituras.

- E Jesus Cristo disse ao aleijado... levante-se e voe!- ele ironizou, e jogou o avião para longe.- Não sou pervertido, sou só realista. Não vou te julgar se você não quer contar o que faz sozinha.

Daquela vez ele tinha sido realmente direto, mas não se abalou ou esperou uma reação dela. Sorriu, quase inocentemente, e segurou ela pela cintura, fazendo com que passasse um braço por seu pescoço, e segurou ele também.

- Certo... agora é a hora que eu pergunto: pra onde vamos?

Apesar do olhar mais que sincero dela, Tate o retribuiu com um sorrisinho debochado...

- Que fofo você tentando jurar algo assim pra mim.- o tom dele foi realmente pervertido, mas ele logo desfocou o olhar do dela, e fez força para arrastá-la até mais próximo da garagem. Apoiou-a na parede ao lado, enquanto se abaixava para abrir o portão.- Você acha que vão me pôr... sabe... na TV?

- Por que ela faria isso?- ele indagou, simplesmente ignorando os outros comentários dela. Parecia que aquele tinha intrigado Tate de forma confusa. Ele levantou a porta, foi até ela para voltar a apoiá-la - afinal, ela precisaria se agachar minimante ali.- Acha que ela tem poder pra fazer? Quer dizer, ela não me tirou de lá sequer quando podia.

- Você acredita na história da Arya, então?- ele foi logo atrás dela, esgueirando-se por debaixo do ferro, sentindo a luz do lado de fora queimar suas retinas. Piscou, ajustando-se rapidamente, e logo olhando ao redor.
A rua ainda estava vazia. Apesar de não serem exatamente os primeiros raios de sol, não haviam muitas casas próximas ao prédio abandonado.
Tate fitou Mel, pondo as mãos nos bolsos do jeans.

- Que uma morte minha foi forjada porque... fiz algo ruim?

- Teoria? Eu estava tentando te pôr medo com aquilo, para que você não dormisse, mas... achei melhor desistir. - ele alegou, passando a segui-la com passos lentos, embora soubesse que nem ela deveria fazer muita ideia para onde estava indo. Seus cabelos loiros e a franja que ficava praticamente por cima de seus olhos eram bem eficazes a ele, já que não parecia precisar abaixar a cabeça diante do sol ou sequer franzir o cenho.- Eu não fiz nada.

Os olhos escuros dele fitaram a imagem de Melissa como se esperassem por uma resposta definitivamente importante.

- Fiz...?

-Ahn, compreendo... mas eu não ia ficar sem dormir por causa de algo assim.
+Ela se espreguiçou, aproveitando o sol que batia em sua pele extremante pálida. Ouvia os passos dele atrás de si. E a sua confusão. Ela olhou-o por cima dos ombros, finalmente parando, e coçou a cabeça.+
-Se eu não tivesse visto você matar dois monitores com meus próprios olhos, talvez acreditasse...